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Doença de Descompressão

A doença de descompressão é uma doença disbárica que resulta da libertação de bolhas gasosas nos tecidos corporais, incluindo o sangue, durante a fase de descompressão. Estas bolhas podem ser silenciosas, provocar alterações de um só órgão ou provocar um conjunto de alterações generalizadas do corpo humano, que podem levar a uma sequela definitiva ou mesmo à morte, se não for efetuado o tratamento hiperbárico.

FATORES QUE PODEM LEVAR À DOENÇA DE DESCOMPRESSÃO

  • Não cumprimento das paragens de descompressão
  • Velocidade de subida muito rápida
  • Perfil de mergulho inadequado
  • Mergulhos sucessivos
  • Exercício físico durante e após o mergulho
  • Má forma física
  • Temperatura (frio durante o mergulho, calor após o mergulho)
  • Obesidade
  • Desidratação
  • Aumento do CO2 no sangue
  • Ingestão de álcool

MECANISMOS DA DOENÇA


A lei de Henry diz que, quando temos um gás em contacto com um líquido através de uma membrana semi-permeável, o gás dissolve-se no líquido até este atingir o estado de saturação. A partir deste momento não haverá mais dissolução, a não ser que se alterem certas condições físicas, como a pressão e a temperatura.

Para o mergulhador, interessa sobretudo a variação de pressão (profundidade) e o tempo de exposição (duração do mergulho), porque tanto a dissolução do gás como a sua libertação não são instantâneas. Esta lei da Física (ver Módulo 2T2 – A física aplicada ao mergulho) ajuda a perceber a dinâmica da dissolução e libertação do gás que respiramos, o ar, nos diferentes tecidos corporais.

A concentração de gás inerte (azoto) no sangue arterial é aproximadamente a mesma concentração que se encontra na mistura gasosa que é respirada. Durante o mergulho, a pressão parcial azoto que é respirado aumenta com a profundidade e a concentração desse gás no sangue arterial aumenta proporcionalmente. Nestas circunstâncias, a pressão parcial do azoto nos tecidos vai aumentando gradualmente até ficar equivalente à nova pressão parcial ambiente.

Durante a descompressão, o azoto move-se na direção oposta, dos tecidos para o sangue, onde é transportado aos pulmões para ser eliminado.

Se este processo ocorrer de uma maneira controlada, de forma a que a tensão do azoto não atinja níveis de sobressaturação insustentáveis, a descompressão ocorre calmamente.

Contudo, se o processo de descompressão for demasiado rápido ou desordenado de tal forma que seja excedida a capacidade que os tecidos, o sistema cardiovascular e os pulmões, têm para remover o azoto, podem formar-se bolhas desse gás nos tecidos, incluindo o sangue, originando a doença descompressiva

Porém, o corpo humano é capaz de tolerar uma certa carga de bolhas. As bolhas no sangue venoso, por exemplo, são eficazmente removidas da circulação pelos pulmões e numerosos estudos demonstraram a presença deste tipo de bolhas, clinicamente assintomáticas, após um mergulho. Além disso, as bolhas podem formar-se em certos tecidos (como os tecidos adiposos) sem causar manifestações da doença.

Contudo, há tecidos (particularmente os tecidos nervosos) muito sensíveis à presença de bolhas de azoto, em que mesmo um reduzido número de bolhas provoca um funcionamento anormal.

As formas como as bolhas libertadas nos tecidos provocam a doença de descompressão são basicamente três:

  • Interrupção da microcirculação nos tecidos
  • Destruição física da arquitetura dos tecidos
  • Desorganização da atividade bioquímica dos tecidos, incluindo do sangue

Como referido anteriormente, os pulmões são excelentes filtros das bolhas de azoto. Contudo, esta capacidade de filtragem é limitada e se a carga for tal que a capacidade pulmonar seja excedida, as bolhas podem passar pelos pulmões e reentrar na circulação arterial (shunt pulmonar).

Por outro lado, o trânsito de bolhas venosas para o sangue arterial pode ocorrer mesmo que o filtro pulmonar não esteja saturado. A verdade é que, em cerca de 25% a 30% da população adulta dita normal, o septo que separa as câmaras superiores do coração (as aurículas) possui um orifício (o Patent Foramen Ovale) por onde as bolhas podem eventualmente passar. Este é uma consequência da circulação fetal e normalmente não resulta em doença. Contudo, estabelece um caminho potencial para as bolhas não chegarem ao filtro pulmonar e, consequentemente, serem injetadas na circulação arterial.

A forma como estas bolhas interferem com a função dos tecidos é um assunto que ainda não está completamente esclarecido. Um mecanismo óbvio é o das bolhas obstruírem fisicamente os pequenos vasos sanguíneos, provocando a isquemia dos tecidos envolvidos.

SINAIS E SINTOMAS


Uma vez que a doença de descompressão pode interferir com a função de um grande número de tecidos do organismo, o número de potenciais sinais e sintomas é vasto. Além disso, as manifestações da doença de descompressão podem ocorrer isoladas ou combinadas.

A dor nos membros (bend) é provavelmente a manifestação mais frequente da doença de descompressão. Pode atingir uma ou mais articulações e pode iniciar-se durante a descompressão ou após a emersão, afetando sobretudo as articulações mais utilizadas durante o mergulho.

Consiste numa dor de instalação gradual, difícil de localizar, que muitas vezes desaparece espontaneamente, sendo com frequência considerada pelo mergulhador como uma “ninharia”. Se a dor aumenta, a sua localização é mais precisa e é descrita como um peso, uma dor aguda perfurante, semelhante a uma dor de dentes.

Por vezes, o mergulhador encontra uma posição em que a articulação é menos dolorosa. Se está localizada numa articulação inferior, o peso corporal pode não ser tolerado por essa articulação.

Os clássicos sinais inflamatórios, como a pele vermelha, quente e edemaciada (inchada), estão normalmente ausentes.

As alterações neurológicas podem ser subtis ou multifocais, originando uma grande variedade de manifestações, desde alterações do humor e da personalidade, até aos casos mais graves de convulsões, perda de consciência e morte, passando pela perda de memória, descoordenação de movimentos e dificuldade em falar.

As alterações dos órgãos dos sentidos como visão enevoada, zumbidos, surdez súbita e vertigens também são possíveis. Se a espinal medula estiver envolvida, podem surgir formigueiros nas pernas e perda de sensibilidade, até á incapacidade completa de as sentir (paraparesia) e mover (paraplegia).

As alterações cutâneas, como a vermelhidão dispersa no corpo (mais frequente nos ombros e tronco), não devem ser relacionadas com reações alérgicas a algum elemento animal ou vegetal do mar.

Algumas alterações gerais não específicas (cefaleias, fadiga, náuseas e vómitos, mal estar geral) podem surgir associadas a qualquer um dos estados anteriores.

CERCA DE 90% DOS ACIDENTES MANIFESTAM-SE NAS PRIMEIRAS SEIS HORAS E MAIS DE 50% NA PRIMEIRA HORA. APENAS 10% MANIFESTAM-SE APÓS AS SEIS HORAS

Normalmente, esta doença manifesta-se após o mergulho ou mesmo ainda dentro de água, sobretudo se a causa foi a omissão dos patamares de descompressão. Se um mergulhador estiver assintomático mais de 48 horas após a saída da água, qualquer sintoma que surja depois deste período muito provavelmente já não se relaciona com a doença de descompressão.

O primeiro socorro consiste, no caso do mergulhador estar consciente, em administrar fluídos por via oral e oxigénio a 100%, transportando-o em posição confortável. Se o mergulhador estiver inconsciente, deve ser abordado segundo os procedimentos recomendados no Suporte Básico de Vida e ser transportados em posição lateral de segurança (PLS), a respirar oxigénio a 100%. O tratamento definitivo consiste na recompressão imediata em câmara hiperbárica, seguida de descompressão gradual, segundo tabelas próprias.

Não esquecer que todos os elementos do grupo de mergulho, especialmente o companheiro do acidentado, devem ser mantidos sob vigilância médica.