Lesson 1, Topic 1
In Progress

Alteração dos Fatores de Segurança das Tabelas

Falou-se já resumidamente nas situações extraordinárias que podem alterar substancialmente os fatores de segurança previstos nas tabelas e computadores de mergulho e, consequentemente, originar um acidente de descompressão (DCS). É altura de entrar em maior detalhe sobre o assunto, porquanto o seu conhecimento mais profundo pode ajudar a compreender e a não menosprezar os perigos inerentes à prática desta atividade.

O SHUNT PULMONAR E O INTERVALO DE SUPERFÍCIE


O shunt pulmonar provoca uma alteração nas condições de difusão dos gases (trocas gasosas) nos capilares alveolares, devido às micro bolhas existentes, causando um shunt artério/venoso. O efeito depende do tempo, começando provavelmente durante a subida, aumentando entre os 15 a 30 minutos depois de atingida a superfície e subsistindo até 90 minutos ou mais.

Filtragem pulmonar normal
O azoto liberta-se do sangue para o interior do alvéolo sob a forma de gás
Filtragem pulmonar diminuída devido à barreira criada pelas microbolhas em circulação
O azoto dissolvido reentra na circulação
CONSEQUÊNCIA

Dificuldade nas trocas gasosas, com maior lentidão na dessaturação. Pressões dos gases inertes nos tecidos maiores do que as calculadas, causando provavelmente sintomas de acidente de descompressão do tipo I.

REGRAS

Deixar passar pelo menos duas (2) horas depois de terminado um mergulho antes de iniciar outro (mergulho sucessivo).

ATENÇÃO

Infelizmente, alguns operadores de mergulho têm a má prática de contar apenas com 1h a 1,5h de intervalo de superfície entre dois mergulhos sucessivos (tempo é dinheiro!).

Há que evitar tais operadores ou alertá-los de que isso pode prejudicar a saúde dos clientes e envolver a responsabilidade civil dos operadores.

Alguns tipos de computador têm em conta o efeito do shunt com uma razoável aproximação matemática.

TRABALHO FÍSICO INTENSO


Aumenta a relação de perfusão nos músculos, originando uma maior dissolução dos gases inertes nos órgãos e tecidos afetados.

CONSEQUÊNCIA

A pressão dos gases inertes nos tecidos é mais elevada do que os valores calculados. O efeito é mais intenso nos músculos.

REGRAS
  • Para um tempo de mergulho igual ao encontrado na tabela, tomar o valor imediatamente superior.
  • Para valores intermédios (o tempo de mergulho situa-se entre dois valores indicados na tabela), tomar o valor a seguir ao valor imediatamente superior.

FRIO INTENSO


Provoca a vasoconstrição dos vasos sanguíneos (pele).

O frio intenso causa vasoconstrição dos capilares, reduzindo a velocidade de dessaturação.
CONSEQUÊNCIA

Velocidade de dessaturação reduzida durante o final do mergulho, principalmente durante a descompressão. O efeito é mais pronunciado quando a temperatura no princípio do mergulho está acima do normal originando uma vaso dilatação dos vasos sanguíneos e, consequentemente, uma maior perfusão.

REGRAS
  • As mesmas da situação anterior. Para um tempo de mergulho igual ao encontrado na tabela, tomar o valor imediatamente superior.
  • Para valores intermédios (o tempo de mergulho situa-se entre dois valores indicados na tabela), tomar o valor a seguir ao valor imediatamente superior.

VELOCIDADE DE SUBIDA REDUZIDA (< 10m / min)


Durante uma subida lenta os tecidos médios e lentos continuam a absorver gás inerte.

CONSEQUÊNCIA

A pressão do gás inerte nos tecidos médios e lentos é maior do que a calculada.

REGRAS

A diferença entre o tempo utilizado na subida real e o tempo de subida indicado na tabela (supondo uma velocidade de subida igual a 10m/min) é adicionada ao tempo de mergulho.

A descompressão é feita de acordo com o novo (fictício) tempo de mergulho (também chamado tempo de mergulho ajustado).

Para evitar a dissolução adicional de gás inerte nos tecidos lentos, é recomendado utilizar em mergulhos profundos (40m e mais) velocidades de subida maiores e ajustá-las de acordo com a profundidade do momento:

  • subida até aos 30m – 18 a 20m/min
  • de 30m para 20 m – 12 a 15m/min
  • de 20m para 10m – 10 a 12m/min
  • de 10m à superfície – 6 a 10m/min

Alguns dos mais modernos computadores de mergulho fazem o controlo da velocidade de subida de acordo com a profundidade

DESCOMPRESSÃO OMITIDA OU ABORTADA (subida a 10m/min)


A pressão crítica (tolerância dos tecidos) pode ser excedida, originando a formação de bolhas.

CONSEQUÊNCIA

Podem ocorrer sintomas de acidente de descompressão dos tipos I e II, dependendo dos tecidos afetados. Quanto mais profunda for a paragem de descompressão omitida ou encurtada, mais os tecidos de período curto são afetados e mais graves serão os sintomas.

REGRAS

As regras seguintes apenas são aplicadas se a profundidade da paragem de descompressão omitida ou abortada não for maior que -6m (-4m em altitude).

  • Se não houver sintomas de acidente de descompressão ou de aeroembolismo e se for possível fazer uma segunda descida dentro de 2 a 3min (ar disponível e bom estado físico e mental), então, e só então:
    • Ir para o patamar situado a profundidade maior do que a profundidade da paragem omitida ou abortada.
    • Repetir esta paragem completamente.
    • Aumentar os tempos de todos as paragens seguintes em 50% dos valores indicados pela tabela.
  • Não voar nem subir a altitudes elevadas durante as 7 a 12 horas seguintes.
  • O aparecimento de sintomas pode demorar várias horas, pelo que todas as atividades de mergulho devem ser interrompidas durante pelo menos 12 horas.

Nunca considerar qualquer tipo de descompressão dentro de água como forma de tratamento. Em presença de um acidente de descompressão, o tratamento adequado é o seguinte:

  • colocar a vítima em posição confortável
  • administrar oxigénio puro
  • dar a beber água (1 litro ou mais)
  • transporte rápido para uma câmara hiperbárica
  • tratamento com O2 na câmara sob
  • supervisão médica (2,5 a 2,8 bar)

SUBIDA DE EMERGÊNCIA (velocidade > 10 m/min)


A pressão critica dos tecidos rápidos e médios pode ser excedida, originando a formação de bolhas. Pode dar-se a expansão violenta do ar nos pulmões, se não for expirado com a rapidez necessária.

CONSEQUÊNCIA

Podem ocorrer sintomas de acidente de descompressão do tipo II, dependendo dos tecidos afetados, ou pode haver aeroembolismo.

REGRAS
  • Se não houver sintomas de acidente de descompressão ou aeroembolismo e se for possível voltar a descer dentro de 2 a 3min, então, e só então:
    • Descer para metade da profundidade do mergulho abortado.
    • Estar cinco minutos a essa profundidade.
    • Iniciar a subida à velocidade de 10m/min.
    • Aplicar os valores indicados na tabela de acordo com a profundidade atingida quando o mergulho foi abortado e o tempo total desde o início do mergulho até ao início da última subida.
  • Não voar durante as 12 horas seguintes ao mergulho.
  • Não mergulhar pelo menos durante 24 horas.

Acontecimentos sucessivos deste tipo podem danificar os vasos capilares, causando grandes alterações na micro circulação, com efeitos contrários na saturação/dessaturação.

Numa situação de emergência que requeira o encurtamento de uma paragem de descompressão, optar sempre por completar os patamares de maior profundidade, encurtando os patamares mais próximos da superfície.

MERGULHOS REPETIDOS/MERGULHOS EM FÉRIAS


Com a elevada frequência com que normalmente são feitos os mergulhos nestas circunstâncias, os tecidos lentos não têm tempo para dessaturar totalmente, podendo portanto atingir níveis muito elevados de pressão de gás inerte dissolvido. Muito pouco se conhece sobre todos os possíveis efeitos deste tipo de mergulhos!

CONSEQUÊNCIA

Podem ocorrer sintomas de acidente de descompressão do tipo I (principalmente na pele) até 2 a 3 semanas depois ou durante a viagem de avião.

REGRAS

Pausa de 1/2 dia de 3 em 3 dias ou de 1 dia por cada semana de mergulho.

Fazer patamares de descompressão mais longos do que o que está indicado na tabela produz o efeito contrário ao pretendido: provoca uma dissolução adicional de gás inerte nos tecidos lentos, não prevista na tabela.

Um terceiro mergulho no mesmo dia, só deverá ser feito de dois em dois dias.

VOAR DEPOIS DO MERGULHO DE FÉRIAS


A pressão dentro da cabina dos aviões (mesmo nos pressurizados), é inferior à pressão atmosférica. A pressão normal nas cabinas pressurizadas é 0,75 a 0,85bar, de acordo com as regras da IAA.

CONSEQUÊNCIA

Esta pressão inferior à pressão atmosférica conduz a uma descompressão adicional, originando provavelmente que sejam excedidos os níveis de tolerância dos tecidos.

RECOMENDAÇÃO

Não mergulhar nas 12 a 24 horas que antecedem o voo.

IMPORTANTE

Ao contrário do que se pensa, os mergulhos demorados e a baixa profundidade são mais críticos no que respeita às viagens em avião. Nesse tipo de mergulho, os tecidos com períodos muito longos têm tempo suficiente para se saturarem, o que obriga depois a um longo tempo de dessaturação.

Por outro lado, os tecidos lentos têm um baixo nível de tolerância ao gás inerte (azoto) dissolvido.

PROBLEMAS MÉDICO/FISIOLÓGICOS (medicamentos, gordura, idade, etc.)


Provocam alterações nos fenómenos difusão/perfusão e alterações psíquicas. Por outro lado, de acordo com recentes publicações de estudos americanos, parece que o efeito prejudicial da gordura tem sido sobrestimado (10ª comunicação NAUI).

CONSEQUÊNCIA

O processo de saturação/dessaturação pode ser alterado, originando uma maior dissolução ou menor libertação do gás inerte do que a normalmente estimada. Por seu turno, a alteração do estado psíquico em combinação com a narcose pode ser fatal.

REGRAS

O mergulho só deve ser realizado em perfeitas condições físicas e psíquicas.

Conhece-se muito pouco sobre o efeito dos fármacos em hiperpressão, portanto, é preciso muito cuidado quando se toma qualquer tipo de medicamento.

Neste caso, é preciso consultar o médico, restringir as actividades de mergulho a baixas profundidades e evitar mergulhos em esforço, que poderão provocar stress físico e psíquico.